Jornal da USP - 25 de agosto de 2023
Outro ponto exacerbado pelas mídias digitais, além da popularização instantânea de informações de qualidade duvidosa, é a facilidade conferida a médicos e cientistas negacionistas para propagar desinformação em larga escala, valendo-se de suas credenciais clínicas ou acadêmicas para dar um verniz de legitimidade científica aos seus argumentos.
“A desinformação ambiental é uma das pautas centrais na propaganda política da extrema direita brasileira, servindo de argumento para o desmonte da proteção do meio ambiente e o avanço sistemático de atividades extrativistas no Brasil”, diz o relatório Panorama da Infodemia Socioambiental, produzido no início deste ano pelo Laboratório de Estudos de Internet e Mídias Sociais (NetLab), da UFRJ.
“Historicamente, há grupos econômicos que questionam dados científicos e acadêmicos que vão contra os seus negócios”, disse ao Jornal da USP a coordenadora do NetLab, Marie Santini. A indústria do tabaco e a dos combustíveis fósseis seriam exemplos disso. Esse envolvimento mais recente com movimentos de extrema direita, na avaliação de Santini, se dá por uma questão de “conveniência”, por se tratar de grupo político que está ideologicamente disposto a negar a ciência que não lhes convêm.
“Eles viram que esse era um grupo político que criava um ecossistema de mídia paralelo; então eles falaram: ‘ótimo, vamos criar controvérsia’”, diz a pesquisadora. Nessa tática, se um jornal noticia que o desmatamento na Amazônia está aumentando, basta publicar um texto em outro veículo dizendo o contrário. “Você nem precisa provar que algo está errado, só precisa gerar uma dúvida, dizer que existe uma controvérsia. É aí que a indústria se esconde, porque eles dizem que não estão produzindo desinformação, estão apenas questionando algo”, completa Santini.