Nexo Jornal - 7 de janeiro de 2024
Um ano após o ataque da turba bolsonarista aos prédios dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023, o Supremo Tribunal Federal condenou 30 pessoas, com penas que passam dos 15 anos de prisão em parte dos casos. Há centenas de denunciados, entre os quais PMs do Distrito Federal apontados como omissos. Apenas um financiador foi acusado formalmente. Organizadores e mentores intelectuais do ataque ainda estão sob investigação em inquéritos da Polícia Federal, sob a guarda do ministro da corte Alexandre de Moraes, assim como integrantes das Forças Armadas envolvidos na trama.
Uma CPI foi realizada pelo Congresso e apontou diversas pessoas que deveriam ser responsabilizadas, incluindo Jair Bolsonaro. O ex-presidente, além de investigado pela empreitada golpista, está inelegível, por decisão da Justiça Eleitoral, devido ao uso da máquina pública para a divulgação de mentiras sobre o sistema eletrônico de votação. Uma ação penal contra o líder de extrema direita e outros políticos que alimentaram o desrespeito ao resultado das urnas ainda depende da Procuradoria-Geral da República, sob novo comando em 2023.
Já as redes sociais, onde a campanha de desinformação contra o sistema eleitoral e outros pilares democráticos se alastraram, permanecem submetidas à mesma lei que regia o mundo digital antes do quebra-quebra promovido no Congresso, no Palácio do Planalto e no Supremo.
Diante desse cenário, o Nexo perguntou a oito especialistas, de esferas diversas, o que é preciso fazer para que nunca mais um 8 de janeiro se repita no Brasil. Veja abaixo o que eles disseram levando em conta as áreas da política, das comunicações, dos militares e do direito.
"Uma regulação das redes por mais segurança", Marie Santini
Professora da Escola de Comunicação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), fundadora e diretora do NetLab, laboratório de pesquisa das redes sociais:
“Os ataques de 8 de janeiro foram consequência de uma campanha de desinformação permanente e em larga escala contra as instituições democráticas e a integridade eleitoral. A propagação de desinformação incitando golpe de Estado ocorre de forma sistemática nas redes digitais há alguns anos no Brasil, e as plataformas tiveram um papel central nisso.
A arquitetura e os algoritmos das plataformas permitem que conteúdos falsos e extremistas sejam distribuídos às pessoas mais propensas a narrativas tóxicas, fomentando o discurso de ódio e a concretização de atos violentos. O modelo de negócios dessas empresas permite o impulsionamento de qualquer tipo de conteúdo (inclusive falso, tóxico e de incitação aos ataques), de forma segmentada porém sem transparência, e lucra com a estruturação de uma indústria da desinformação. Já a moderação de conteúdo das plataformas é uma caixa preta: não sabemos seus critérios nem seus recursos.
Portanto, evitar que episódios como os de 8 de janeiro se repitam exige que o Congresso aprove com urgência um projeto de lei que regule a atuação dessas plataformas no país, lhes impondo transparência sobre algoritmos, moderação e publicidade, além de responsabilidade sobre riscos sistêmicos que seus serviços podem causar. O objetivo é tornar o ambiente digital mais seguro, protegendo usuários, consumidores e as próprias instituições brasileiras.”